terça-feira, 19 de outubro de 2010

três cenas paulistanas em uma semana

No tempo de uma semana presenciei algumas cenas paulistas, não muito diferentes de tantas outras, talvez até bem piores. De qualquer forma, penso que são significativas. Na semana passada fui almoçar em um restaurante para o qual eu vou às vezes.
1.  Já na chegada percebi um cheiro muito fétido. O dia estava relativamente quente e o restaurante cheio. Perguntei porque não era possível abrir as janelas. "Por causa do cheiro", disse a moça. Haviam espalhado tanto lixo, de um mal-cheiro tão tenebroso na rua, que a escolha era: morrer de calor no restaurante, ou ter o seu apetite estragado justamente durante a refeição. Não faço ideia quem foi o autor da sujeira. Mas sei que resídios humanos de todos os tipos, caninos também, além de lixo são uma característica desta região a 2 ou três quadras do símbolo paulistano, a avenida Paulista. O que isto me diz? Não isoladamente, claro, mas no contexto desta cidade onde vivo já há três anos? Que tudo de imundo, fétido e feio nas ruas é aturado, contanto que o consumo permaneça intocado. Este é o espírito que percebo.
2.  O segundo episódio ocorreu hoje mesmo. E não foi desagradável. Andava pelas ruas do Itaim, exuberantes em sua riqueza, embora não para o meu gosto pessoal. Vi então um rio, eu diria até bastante caudaloso por se tratar de um 'rio de rua'. Ocupava a largura que vai dos pneus esquerdos aos direitos dos carros. Gostei do que vi, instintivamente, antes de raciocinar. Lamentei quando percebi há quanto tempo não podia contar com um elemento singelo deste no meu cotidiano como um rio fresquinho e limpo. E lembrei-me que ali, em plena rua, o tal rio não podia ser coisa boa. Havia chovido? Recorri a minha memória e me parecia impossível que o rio tivesse se formado por obra da natureza. Então lembre de outro riozinho, este 'menos caudaloso' que por muitos meses (talvez 18!) me intrigou nos jardins. Também lá o rio era de água cristalina. Na época lembro de ter chegado à conclusão, com ajuda de uma reportagem da CBN, de que se tratava de água desperdiçada pela construção civil. Limpinha... é possível que tenha sido o caso da água do Itaim também. Como pode, por tanto tempo não se reaproveitar esta água...!
3. Este episódio é muito banal. E ainda assim, significativo, a meu ver. Noutro ponto do Itaim eu procurei andar na calçada em um dia de chuva. Foi difícil. Por quê? Ora, porque volta e meia o meu guarda-chuva não "cabia" na calçada. Era exprimido entre as grades dos prédios e alguma árvore (na verdade às vezes palmeiras finíssimas). A frente de tantos prédios luxuosos do Itaim não comportam um... guarda-chuva! Naturalizamos isto, indo para a rua, que não é lugar de pedestre. Mas se não cabe guarda-chuva, não cabe pai com filho de mão dada, não cabe carrinho de bebê, não cabe a cadeira do cadeirante. Namorados também não cabem. Tem que passar em fila indiana. Isto porque estamos falando dos padrões civilizatórios demandados pelo luxo paulistano. Aquele que escala para a estratosfera em termos de consumo e que se orgulha o PSDB. Não me surpreende nem um pouco este tipo de opção da elite brasileira (ou melhor, paulistana). Mas segue me chamando a atenção, apesar do devido adestramento e acomodação que se sofre quando se opta por viver aqui.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

E você, o que pensa?