terça-feira, 22 de novembro de 2011

amigo secreto e o ato de presentear




Para o espanto de muitos e a indignação de outros, as ruas e lojas já se vestiram com as roupas de inverno do nosso natal importado. Tempo de amigo secreto também. Considero o amigo secreto um mecanismo engenhoso, dado que dispensa as pessoas de terem de presentear a todos, ou a deixar alguns de fora, o que deixa a todos entre grandes despesas e grandes constrangimentos. Também engenhoso o elemento da surpresa, quando não há trapaças, claro.
Só não entendo o amigo secreto que vem com a lista de "sugestões" de presente, segundo o presenteado. A lista de sugestões nos salva de micos, claro. De presentes totalmente despropositados. Mas livra também da surpresa e abole o interessante jogo que é presentear e ser presenteado justamente por aquele elemento da família/ amigos com o qual menos se tem afinidades. A lista de presentes é praticamente tão chata e antissocial quanto ir ao shopping sozinho se comprar o tal do objeto almejado.


Com efeitos colaterais na minha opinião piores do que as dores que pretende curar, a lista de sugestões nos lembra de que presentear é um dom. Como todo dom, ele está distribuído de forma completamente disforme sobre o globo. Uns demonstram extrema habilidade, enquanto outros...



Em geral presenteamos a partir das ideias pré-concebidas que temos dos outros. Fulano é esportista (penso), portanto (penso) ele irá gostar de uma jabulani (penso). Cicrana é perua (penso), portanto (penso), irá gostar de uma bolsa de oncinha. Ela gosta de ler (penso), portanto (penso), ela gostará de um livro. Há atletas que detestam futebol e peruas que talvez dispensem uma bolsa de oncinha (talvez por já ter várias, rs). E há pessoas, como muá, que gostam de ler e também de selecionar bem o que leem...

O fato é que em termos de presentificação é muito comum chutar a bola para fora do estádio. O preço médio que estamos dispostos a pagar piora um pouco nossas chances de ao menos chutar na trave. Mesmo assim, sou a favor de insistir na presentificação que insiste em treinar, desafiar esta habilidade de presentear nas pessoas. Acho que isto nos traz mais para perto das discrepâncias de percepção que existem em nosso meio. E é claro, uma chance em cem, de alguém que nos conheça melhor do que nós mesmos, que nos desafie com algo que não sabíamos de que poderíamos gostar.


Tenho uma política pessoal de presentear. Cumpro com minhas obrigações rituais de final de ano, com boa vontade, mas no resto do tempo não presenteio - nem para aniversário, dias dos pais, etc. (Ensinaram-me quando criança que isto era consumista, e eu acreditei.) 
A não ser que... eu encontre algo que me lembre certa pessoa. Aí, totalmente fora de época, eu lhe dou o dito objeto, por mais simples que seja. Tudo bem, eu poderia esperar as datas festivas, mas com isto um pouco da espontaneidade daquele ato se iria. 

Esta postagem foi bem dentro do paradigma consumista. Mas pretendo escrever uma que mexa mais com isto. Se bem que a espontaneidade do ato de presentear, nem mastercard não paga.

Poderá também gostar desta outra postagem, sobre dia das crianças

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

A feiura das línguas e o habitus autoritário

Trabalhando há alguns anos com a língua alemã, percebo que há bastante gente que já chega para ter aula influenciada pela imagem da nova Alemanha, que o Estado alemão procura tanto, e inclusive com bons meios financeiros, incutir aos seus cidadãos e transmitir ao mundo. 
Mesmo assim, sempre aparecem também alunos - de idades variadas - com aquela ideia da velha Alemanha, principalmente a velha Alemanha do nacional-socialismo, na maior parte das vezes mediada por Hollywood. 

Alemão seria uma língua agressiva e feia, dizem muitos - outros apenas pensam. 




Se, em primeira linha, o vídeo acima serve como exemplo de língua alemã, então só posso concordar: o discurso deste homem é feio, grosseiro e agressivo.
(Observação: há um forte ruído do microfone nesta transmissão, o som não está límpido.)
Agora, português parece uma língua cantada, afável,doce e lírica na voz desta homem?
Reparem no final. 



         Habitus fascista pode existir em qualquer língua. O amor e o lirismo podem ser cantados em qualquer língua. Conservemos a beleza de nossa língua. Exploremos sua potencialidade, diminuamos os ímpetos autoritários e fascistas que se apossam dela. 

sábado, 12 de novembro de 2011

O reitor e os quilombolas

        Estive nesta semana na XXVIII Semana de História da Unesp, no campus de Assis. Cheguei meio atordoada da viagem na quarta-feira, mas ainda a tempo de ver a fala do Prof. Oseias Oliveira da Unicentro - Universidade do Centro-Oeste-, que tem prédios em Irati, Guarapuava e mais 4 campi avançados, no Paraná. O tema de Oseias era a festa de São Gonçalo, uma prática que os quilombolas deixaram por uma época, e retomaram depois quando conseguiram se re-estabelecer no meio rural.   
         Interessante mesmo foi a contextualização das comunidades quilombolas em meio à "macha branca", uma série de colônias ucranianas, polonesas, alemãs, italianas, etc. O interesse do professor surgiu por meio de uma aluna quilombola em seu curso, a única negra da faculdade. (Isto me lembra minha infância, onde em um colégio de 3 mil alunos havia apenas 1 aluno negro, que naturalmente destoava muito do resto).
        A presença desta única aluna mobilizou professores de diversas áreas da universidade para formar um cursinho para os quilombolas próximos ao campus. É um privilégio para eles terem professores da universidade já durante a preparação para a mesma. O detalhe bonito e significativo é que o reitor, Vitor Hugo Zanetti, também entendeu a importância do projeto, e dá aulas de matemática aos sábados na comunidade. 
     
           Existe um lugar neste país onde um reitor doa seus sábados para dar aula gratuitamente aos quilombolas. Tem iniciativas que me deixam simplesmente enternecida. Em breve aquela uma aluna não estará mais só, e haverá muitos outros como ela.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

il vero universal e o selo de qualidade feminista

Como bem sabemos, quando o "cidadão brasileiro de bem" - sabe aquele que supostamente paga os impostos, que troca de carro regularmente e vai lustrar sua cultura nos EUA ou na melhor das hipóteses em Paris- aparece na capa da revista VEJA, ele é um homem branco. Para a VEJA que universal e masculino se confundam é um óbvio ululante.

Isto é tão banal e repetitivo que seria um saco demonstrar.
Vale a pena, no entanto, estar atento a iniciativas ainda isoladas que trazem mulhees como possíveis universais, sem que isto evoque o seu sexo. Universal sem sexualização, é o que vemos abaixo, quando o cartunista Carlos Latuff desenha umA estudante como representante d@s estudantes que ocuparam a reitoria da USP.

Esta é fresquinha, saída do forno hoje


Esta é de fevereiro de 2011





Neste contexto árabe que o nome Latuff evoca, lembrei-me de outra situação que merece menção honrosa. Isto foi lá no começo da Primavera Árabe, e a Carta Capital nos apareceu com esta mulher à esquerda. Além de sublinhar o novo ou renovado protagonismo feminino no Oriente Médio, a revista apresentou uma mulher como representante 
"d@ manifestante da praça Tahrir".





                                                    Qual é o verdadeiro universal?


É quando um representante da espécie humana - para qualquer fim: científico, jornalístico, estatístico-  puder ser uma mulher, negra e idosa, e ela ser reconhecida como tal. 
É quando além de representar o universal, o homem branco, heterossexual também seja visto também como algo particular. 
Por seus méritos, selo de qualidade feminista a ambos, Carlos Latuff e Carta Capital.  

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Tempo e história

Tristes daqueles que temos história.
Buscamos por aquilo que apenas os outros deveras têm.
Pois viver o tempo presente é viver o tempo eterno.