quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Antídoto Píppi Meialonga


         Dia 12, dia das crianças, mais um dia no calendário do consumo e da afetividade. Mais um dia no calendário da afetividade consumista e por outro lado do consumo afetivo. A data está aí, e é difícil dar um novo sentido a ela quando o sentido social já está tão atrelado ao consumo. Minha admiração a quem consegue, e sei que o faz com o empenho de muitas energias, desviar deste massacre simbólico e propor um sentido diferente para a criança que está próxima- filh@, irm@, net@, etc. 
     Para nós, blogueiras feministas, tempo de falar do sexismo que envolve esta data específica. Nesta postagem, falarei de sexismo em produtos culturais, e portanto produtos de consumo, deixando claro, porém, que minha sugestão de produto cultural não é da ordem "o que você deveria comprar para o dia das crianças". A sugestão fica aí, para comprar se der, quando quiser e puder, e se não quiser nem puder, só saber da personagem Pipi, recontá-la e recriá-la já é divertido demais, o livro é só um detalhe.  
          Eu lembro da Píppi Meialonga quando me chegam às mãos alguns livrinhos da minha irmãzinha, oito anos. Este daqui foi o último que "li' com ela. Chama-se "As amigas secretas das fadas". A julgar pelo título, até que pode ser uma historinha legal, não é? Mas é daqueles livros infantis que deveria vir com a etiqueta "conteúdo não recomendável para menores de 16 anos". 
O objetivo das fadas é ir a uma festa. E as "etapas" da aventura são:

 Passar no salão de beleza de uma das fadas para arrumá-lo.



E passar na casa de outra fada para escolher as roupas e os acessórios.   
        Ó céus! Isto lá são etapas de uma aventura? De uma história? Onde está a história? O próximo passo será produzir livros em que a aventura de pequenas meninas seja fazer compras, sem a vergonha deste último disfarce, em que as fadas fazem coisas tão nitidamente ligadas ao consumo e à futilidade. O que eu julgo particularmente curioso, é que uma série de pais (estou falando homens) que é muito ávida em criticar o consumismo da mulher, não raro acima de suas posses, não vê nada de errado em "instruir" a filha com este inocente livrinho. Qual é a ação das fadas? Senão arrumar um salão de beleza, escolher entre modelitos...?

Antes de que eu fique doente, preciso falar do antídoto Píppi Meialonga. 


Bom dia, Píppi. Bom dia, Sr. Nilson.

            Eu tinha exatamente a idade que minha irmãzinha tem agora quando li a história da diabrete ruiva. Píppi é uma menina tão forte que pode carregar um cavalo. Ela mora sozinha, sozinha, é dona do seu próprio nariz. Sua mãe é um anjo e seu pai um pirata. Não é que ela não goste dos seus pais, ela até sente saudades deles. Mas a vida sem adultos chatos pode ter muitas vantagens! Os seus vizinhos-amigos, Aninha e Tom, são crianças tipicamente burguesas e sabem muito bem o que é ter de se submeter a uma disciplina para tudo. Para eles a Vila Vilekula é um território de liberdade. Píppi é incrivelmente livre.  Com um baú cheio de moedas de ouro que o pai deixou e que ela usa com parcimônia, sua vida está garantida. Ela não precisa de muitos brinquedos, porque sua própria casa e sua invencionice bastam para garantir 24 horas de diversão. Píppi sequer vai à escola, este lugar onde se domesticam crianças!

 Píppi não tem patrão nem pátria. Não obedece as leis dos adultos, do mercado, nem do Estado. Sim, a liberdade de Píppi é altamente subversiva! Até 1995 a tradução para o francês não correspondia ao original para "não desviar demais da realidade". No Irã Píppi não é bem-vinda por não representar os valores da Revolução Islâmica. Também pudera... (Fonte) 


 No Brasil há duas edições com o mesmo texto, traduzido diretamente do sueco, ambas da Companhia das Letras. Eu prefiro as ilustrações antigas, no caso do livro da esquerda. Esta nova roupagem da direita me cheira a blacklash e domesticação. Olha as perninhas cruzadas dela... e onde isto representa o humor que perpassa todos os livros? Não, nem sua mãe literária, a escritora Astrid Lindgren, nem Píppi ela mesma merece isto. Nem nós. Senão um dia Píppi ainda irá ao shopping com as amiguinhas de colégio escolher roupas com o cartão de crédito ouro do seu pai pirata do sistema financeiro...

Nada mais anti-Píppi. 
E algo anti-Píppi só pode ser combatido com o antídoto da Meialonga.
Bom dia das crianças subversivo a todos. 




2 comentários:

  1. A ilustração do segundo livro é da Lauren Child, não li esse, mas sou fã do Charlie e Lola e da Clarice Bean. Acho que ambas as obras colocam as meninas como protagonistas sem sexismo.

    ResponderExcluir
  2. Oi Fabiana. desculpe a demora em responder. Eu tenho a impressão de um sexismo mais sutil, no caso da Lauren Child como desenhista da Píppi. Tem a ver com imagem mesmo. Eu cresci com a visão de uma menina orgulhosa, postura ereta, expressão feliz e confiante. E perder isto eu acho uma pena.

    Abraço,

    Barbara

    ResponderExcluir

E você, o que pensa?