terça-feira, 3 de abril de 2012

Usos e abusos de Deus e do Divino


Espero desta postagem que ela seja herética para crentes e para ateus que vêem a crença como um delírio, na formulação de Richard Dawkins. 


Como milhares de brasileiros fui infectada pelo meme da família desafinada, vídeo considerado hilário por muitos . E como outros tantos, redescobri o original, um rock cristão da banda exodus: "Galhos secos".   Esta letra interessante me remeteu aos vários deuses que imaginamos, vários mesmo dentro do cristianismo, ou mesmo dentro de uma denominação específica. O deus desta canção é o deus criador, e mais do que isto, um deus criador da beleza. O deus cristão aglutina em sua personalidade esta faceta criadora, muitas vezes uma faceta bondosa e paterna, mas não obstante também apresenta volta e meia uma faceta rancorosa, raivosa e punidora. Há a faceta colérica de deus, que castiga maus atos e mesmo a falta de fé. Quando um ateu é castigado pela vida, normalmente há um crente que creia, ou até mesmo expresse, a opinião de que o mal se trata de uma vingança divina que é a resposta à descrença.  

Olhai os lírios do campo: eles cresceram, para nossa alegria

"Para a nossa alegria", diz o estribilho da canção. É providencial falar em flores para remeter à divindade. As flores são o símbolo da beleza produzida por uma força não-humana, diferente de um quadro ou de uma sinfonia, daí por uma força divina para os crentes. É um sentimento puro, de alento, pensar que a beleza foi criada única e exclusivamente para a nossa apreciação, ou como diz a letra "para nossa alegria".  

Beleza esta que, não houvéssemos nós, os humanos, não seria admirada por ninguém, pois por mais semelhanças que cada novo achado científico traz entre nós e em especial os chimpanzés, nossos companheiros em 99% da sequência genética, ainda não foi relatado nos mesmos o senso estético. Por maior que seja a continuidade biológica entre nós e eles, a apreciação da beleza se põe como uma barreira, nos torna discretos em relação uns aos outros: ficamos cada um no seu próprio patamar. Que, aliás, é como os criacionistas enxergam a fauna: como cada espécie tendo sido criada isolada das demais, pelas mãos de um deus que não põe a natureza em movimento, para evoluir, um deus este de tantos outros. 

A beleza tem sido explicada como um subproduto da evolução das espécies, em uma ideia que já foi apresentada pelo velho Darwin: de que o supérfluo existe para atrair o sexo oposto. Há o exemplo dos pássaros, onde geralmente é o macho o mais belo, quando há dimorfismo sexual. O que menos pessoas parecem deduzir é que, se o belo é o macho, a fêmea supostamente é a apreciadora, a poetisa. Será mesmo? Será que a pavoa aprecia a exuberância do pavão? Não conheço estudo neste sentido. Além do mais, a escolha do parceiro pela beleza não concatena muito bem com a teoria da evolução da espécie: pois torna-se um fim em si mesmo, no máximo ao escolher o parceiro mais belo, se terá mais descendentes belos, que por sua vez terão mais descendentes belos. A beleza pode ser de vantagem para a procriação (no caso de a pavoa poder de fato apreciá-la), mas para a sobrevivência estrito senso a penugem ostentatória do pavão não passa de uma  bela desvantagem. 

Estou bem longe de acreditar, assim como os criacionistas americanos, que os dinossauros sejam o  produto de uma farsa de uma ciência diabólica: eles nunca teriam existido e foram plantados nas escavações por pessoas litearalmente de má fé. Ainda assim, alguns argumentos criacionistas devem nos fazer pensar. O design inteligente é uma consideração interessante. A ele subjaz uma pergunta: não seria uma sequencia por demais estrondosa que acasos subsequentes levariam a formas tão complexas e inteligentes como aquelas materializadas pelos seres humanos? Que o acaso produza a vida, até onde se saiba, só na Terra, já faz pensar. Mas que as formas complexas que temos hoje sejam fruto de acasos faz pensar ainda mais. E ainda mais quando estas formas complexas vem embutidas com a ideia de beleza, que as remete à metafísica, que as faz únicas entre os animais como somos únicos os seres vivos dentre diversos planetas.

Do meu ponto de vista, embora isto seja humano, e demasiado humano, o espanto próprio à nossa espécie, diante da vida ou da beleza não tem de estar, necessariamente, ligado a uma série de prescrições que as religiões concebem para além da admiração pelo que é , de fato, admirável. Admirar-se com as formas complexas e inteligentes, para as religiões, está atrelado a concepções étnicas de vários graus, todas elas duvidosas em relação àquele espanto primevo. Porque talvez exista uma força criadora, então homossexuais não podem se casar entre si? A maioria das religiões faz deduções que são difíceis de serem sustentadas, quando se olha para a ciência, a história e principalmente quando se as compara entre si: por que o espanto inicial leva a deduções tão diferentes? Sinal de que as deduções e seus respectivos códigos de ética são aleatórios, embora a ânsia por elaboração e codificação seja um elemento em comum.

Tenho ouvido muito que os agnósticos seriam aqueles ateus que não conseguem se afirmar com todas as letras. Sei que a Associação de Ateus, a Ateia, fomenta esta versão dos fatos. Embora este possa ser o caso de alguns agnósticos, considero o agnosticismo um simpatizante do misticismo: há algo ali, que não está bem claro, e ambas as respostas, religiosa e científica, não me parecem perfeitamente coerentes para explicar beleza, complexidade, leis científicas, leis humanas, e também imperfeições e mistérios nestes leis. Agnósticos, do meu ponto de vista, curvam-se com humildade frente àquilo que os crentes laicos e religiosos, convencidos da inescapabilidade de suas leis, seculares ou sacras, veem com empáfia. Creem no divino como mistério, sem necessariamente crer em um deus, uma força única, uma existência que contemple tudo, que seja ora bondosa, ora maléfica; ora onipotente, ora desafiada por um demônio antagônico. Agnósticos curvam-se ao ainda não desvendado, e rejeitam as empreitadas totalizantes, alimentados por dúvidas que são, elas mesmas, belas e mais perenes do que suas respostas, que estão em eterna mutação ao longo da história humana. 

4 comentários:

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